Lisboa. 30 de Agosto de 1919. Avançado.
Épocas no Benfica: 12 (36/41 e 43/50).
Épocas no Benfica: 12 (36/41 e 43/50).
Jogos: 210. Golos: 149. Títulos: 2 (Campeonato Nacional), 2 (Iª Liga) e 3 (Taça de Portugal).
Outros clubes: SL Luanda. Internacionalizações: 8.
Outros clubes: SL Luanda. Internacionalizações: 8.
Aquele traço afro numa cultura centenária. Que bem fica ao Benfica. Aquela multirracialidade nas suas hostes. Aquele apego aos valores da negritude. Aquele vermelho solidário. Aquela paz nos dois lados da trincheira colonial. Aquele carruagem africana de Eusébio, de Coluna, de Santana, de Rui Rodrigues, de Jordão, de Shéu, de Mantorras. Aquele precursor, Guilherme Espírito Santo – a Pérola Negra.
De ascendência angolana, nasceu em Lisboa, menos de um anos depois de ter sido assinado o armistício que punha termos à I Guerra Mundial, de 14-18. Tinha oito anos, quando a família regressou a Luanda, na expectativa de melhorar as condições de vida. Cedo se iniciou no futebol, jogando em meados dos anos 30 na filial luandense do Benfica. “Sou benfiquista desde os três anos. Havia na altura uns maços de tabaco com as figuras dos jogadores da época. Eu gostava especialmente do Vítor Silva e foi a partir dessa altura que fiquei a torcer pelo clube”.
Como ninguém resiste à usura do tempo, haveria Espírito Santo de substituir Vítor Silva no eixo do ataque do Benfica. Ele que, regressado a Lisboa, já amigo de Peyroteo, passou a equipar de rubro, a partir de 36/37. Era ágil e rápido. Subtil também. Atributos que disfarçavam uma compleição meã. Destacava-se também por um tocante fair-play. “O cavalheirismo das suas atitudes foi faceta evidenciada logo no começo da sua carreira e mantida pelo tempo adiante, com uma dignidade que era motivo de orgulho para os seus amigos e admiradores”, elogiou Ribeiro dos Reis.
Estreou-se em mês de vindimas, na cidade do Sado, em 1936, num embate que se inscreveu no âmbito da transferência do defesa António Vieira para o Benfica. No registo da vitória encarnada, não consta nenhum golo de Espírito Santo, que actuou na metade complementar. Mas nesse mesmo ano, um outro registo, histórico e até à data imbatível, dá conta dos nove golos (!) que apontou no triunfo (13-1) sobre o Casa Pia. Um triplo hat-trick produzido por um temível goleador.
Foi ao FC Porto que mais golos marcou ao longo de 12 temporadas no Benfica. Duas dúzias de vezes obrigou os guarda-redes portistas a olharem com desalento para o fundo das redes. No final da década de 30, numa meia-final da então menina Taça de Portugal, no Estádio do Lima, o Benfica perdeu (6-1) com o FC Porto. Na segunda mão, no Campo das Amoreiras, o triunfo (6-0) foi retumbante. Espírito Santo marcou dois golos e, naquele que terá sido um dos seus melhores recitais, outros golos poderia ter marcado se o jogo não durasse apenas 75 minutos, porque os portistas, humilhados, decidiram… abandonar o campo.
Fez 199 golos em 285 jogos. Esteve duas temporadas sem actuar (41/42 e 42/43), vitima de um grave problema de saúde, que degenerou numa inflamação dos pulmões. Quando regressou, sem prejuízo das suas faculdades, enveredou pelo posto de extremo-direito, optimizando a sua velocidade. Ele que se destacou também no atletismo. “Estava num treino e a determinada altura a bola saiu do campo, fui a correr apanhá-la e sem dar por isso saltei uma barreira de salto em altura. Estava a 1,70 metros e ninguém tinha conseguido fazê-lo”. Não enjeitou o convite para incursão fazer no atletismo. Bateu o recorde nacional, com 1,80 metros, só ultrapassado vinte (!) anos mais tarde. Foi ainda campeão nacional de salto em comprimento e triplo-salto. “Deve ter sido porque em Angola fui mordido por um macaco”, diz meio a sério, meio a brincar.
Oito vezes internacional, venceu dois Campeonatos da I Liga, dois Nacionais e três Taças. Nessa época, o despique Benfica-Sporting era muito também o despique Espírito Santo-Peyroteo. “O Guilherme sempre foi melhor jogador de futebol que eu: mais técnica, mais jogo. Menos prático, menos golos, etc.? Sim, também é verdade. Mas mais jogador”. Com a humildade que caracterizava os melhores, era assim Peyroteo, na primeira pessoa do singular.
Atleta eclético, jogador à Benfica, Guilherme Espírito Santo unia, não dividia. “Naquele tempo, existiam alguns preconceitos por causa dos jogadores de cor. Um dia, em 1947, num hotel da Madeira, queriam colocar-me num anexo por ser negro. Os jogadores do Benfica disseram que para onde eu fosse eles também iam. E acabamos todos no anexo”. Nesse momento, num outro jogo, perdeu o repugnante racismo, venceu o multirracial Benfica. Assim foi sempre doravante.
Águia de Ouro, prémio Fair Play do Comité Olímpico Internacional, Guilherme Santana da Graça Espírito Santo, já octogenário, é o decano dos jogadores do Glorioso. Presidente das comemorações do Centenário, ele simboliza a generosidade misturada com a paixão sem limites e uma longa modéstia, que só os grandes possuem. Com o Benfica, pelo Benfica.
De ascendência angolana, nasceu em Lisboa, menos de um anos depois de ter sido assinado o armistício que punha termos à I Guerra Mundial, de 14-18. Tinha oito anos, quando a família regressou a Luanda, na expectativa de melhorar as condições de vida. Cedo se iniciou no futebol, jogando em meados dos anos 30 na filial luandense do Benfica. “Sou benfiquista desde os três anos. Havia na altura uns maços de tabaco com as figuras dos jogadores da época. Eu gostava especialmente do Vítor Silva e foi a partir dessa altura que fiquei a torcer pelo clube”.
Como ninguém resiste à usura do tempo, haveria Espírito Santo de substituir Vítor Silva no eixo do ataque do Benfica. Ele que, regressado a Lisboa, já amigo de Peyroteo, passou a equipar de rubro, a partir de 36/37. Era ágil e rápido. Subtil também. Atributos que disfarçavam uma compleição meã. Destacava-se também por um tocante fair-play. “O cavalheirismo das suas atitudes foi faceta evidenciada logo no começo da sua carreira e mantida pelo tempo adiante, com uma dignidade que era motivo de orgulho para os seus amigos e admiradores”, elogiou Ribeiro dos Reis.
Estreou-se em mês de vindimas, na cidade do Sado, em 1936, num embate que se inscreveu no âmbito da transferência do defesa António Vieira para o Benfica. No registo da vitória encarnada, não consta nenhum golo de Espírito Santo, que actuou na metade complementar. Mas nesse mesmo ano, um outro registo, histórico e até à data imbatível, dá conta dos nove golos (!) que apontou no triunfo (13-1) sobre o Casa Pia. Um triplo hat-trick produzido por um temível goleador.
Foi ao FC Porto que mais golos marcou ao longo de 12 temporadas no Benfica. Duas dúzias de vezes obrigou os guarda-redes portistas a olharem com desalento para o fundo das redes. No final da década de 30, numa meia-final da então menina Taça de Portugal, no Estádio do Lima, o Benfica perdeu (6-1) com o FC Porto. Na segunda mão, no Campo das Amoreiras, o triunfo (6-0) foi retumbante. Espírito Santo marcou dois golos e, naquele que terá sido um dos seus melhores recitais, outros golos poderia ter marcado se o jogo não durasse apenas 75 minutos, porque os portistas, humilhados, decidiram… abandonar o campo.
Fez 199 golos em 285 jogos. Esteve duas temporadas sem actuar (41/42 e 42/43), vitima de um grave problema de saúde, que degenerou numa inflamação dos pulmões. Quando regressou, sem prejuízo das suas faculdades, enveredou pelo posto de extremo-direito, optimizando a sua velocidade. Ele que se destacou também no atletismo. “Estava num treino e a determinada altura a bola saiu do campo, fui a correr apanhá-la e sem dar por isso saltei uma barreira de salto em altura. Estava a 1,70 metros e ninguém tinha conseguido fazê-lo”. Não enjeitou o convite para incursão fazer no atletismo. Bateu o recorde nacional, com 1,80 metros, só ultrapassado vinte (!) anos mais tarde. Foi ainda campeão nacional de salto em comprimento e triplo-salto. “Deve ter sido porque em Angola fui mordido por um macaco”, diz meio a sério, meio a brincar.
Oito vezes internacional, venceu dois Campeonatos da I Liga, dois Nacionais e três Taças. Nessa época, o despique Benfica-Sporting era muito também o despique Espírito Santo-Peyroteo. “O Guilherme sempre foi melhor jogador de futebol que eu: mais técnica, mais jogo. Menos prático, menos golos, etc.? Sim, também é verdade. Mas mais jogador”. Com a humildade que caracterizava os melhores, era assim Peyroteo, na primeira pessoa do singular.
Atleta eclético, jogador à Benfica, Guilherme Espírito Santo unia, não dividia. “Naquele tempo, existiam alguns preconceitos por causa dos jogadores de cor. Um dia, em 1947, num hotel da Madeira, queriam colocar-me num anexo por ser negro. Os jogadores do Benfica disseram que para onde eu fosse eles também iam. E acabamos todos no anexo”. Nesse momento, num outro jogo, perdeu o repugnante racismo, venceu o multirracial Benfica. Assim foi sempre doravante.
Águia de Ouro, prémio Fair Play do Comité Olímpico Internacional, Guilherme Santana da Graça Espírito Santo, já octogenário, é o decano dos jogadores do Glorioso. Presidente das comemorações do Centenário, ele simboliza a generosidade misturada com a paixão sem limites e uma longa modéstia, que só os grandes possuem. Com o Benfica, pelo Benfica.
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