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    quarta-feira, 9 de novembro de 2016

    [Destino] Ricky: «Nem o senhor Eusébio me conseguiu fazer titular do Benfica»

    «Destino: 80s»: o ponta de lança nigeriano fala dos dias de dor na Luz, dos seis golos marcados num só jogo (e dos cinco noutro!), das saudades do Boavistão e dos dias com José Mourinho na Amadora. A partir de Salvador, no Brasil.


    RICKY: Benfica (1988/1989), Estrela da Amadora (1989 a 1991), Boavista (1991 a 1994) e Belenenses (1994/1995)




    «Desculpe, desculpe interromper, está a esquecer-se de uma coisa importante».
    Hmmmm… de quê, Ricky?
    «O senhor Eusébio dizia sempre: melhor do que tu, só eu e o Julinho».
    O Pantera Negra tinha razão. Na verdade, melhor do que Ricky, só ele e Julinho. Porquê? Ninguém tem melhor média de golos na história do Benfica. Eusébio marcou 473 em 440 jogos, Julinho fez 202 em 200, Richard Daddy Owubokiri tem seis golos em seis jogos.
    Os números de Ricky são objetivos, mas… os seis golos foram marcados na mesma tarde. Com o Estádio da Luz a rebentar de… cadeiras vazias. Cinco mil espetadores foram ver o jogo da Taça de Portugal contra o Atlético Riachense, 11 de janeiro de 1989.
    «Não me venha dizer que não conta. Conta e podia ter feito muitos mais, se o mister Toni me tivesse deixado. Não foi sorte, eu era mesmo artilheiro. Aliás, o meu melhor jogo em Portugal foi outro. Boavista-Estoril, 5-0 [22 de março de 1993]. Adivinhe lá quem marcou os cinco golos (risos)».

    Ricky, o nigeriano de sotaque adocicado, como se tivesse saltado de uma página escrita por Jorge Amado para esta entrevista. Diretamente de Salvador, na Bahia, 53 anos de boa disposição, bom humor, de boa relação com a vida.
    «Com o João [Vieira] Pinto e o Marlon Brandão era fácil marcar golos. Eramos uns diabos. Por favor, envie-lhes um grande abraço do Ricky, o Ricky do shampoo! Que saudades tenho deles e de Portugal».
    Perdão…? O Ricky do shampoo?

    «(risos) Sim, eles percebem. Fui eu que paguei o shampoo no balneário do Boavista durante uma época inteira. Começou com uma brincadeira do Pedro Barny. Disse que eu não tinha cabelo para shampoo e roubou-me o frasco. A partir daí entrei na brincadeira. Antes do duche dava shampoo a todos. Caro? Não, por aquele plantel eu fazia tudo. Amo o Boavista e amo esses colegas todos». 

    Os números de Ricky em Portugal:
    1988/89- Benfica: 6 jogos oficiais/6 golos
    1989/90- Estrela Amadora: 33 jogos/13 golos
    1990/91- Estrela Amadora: 43 jogos/16 golos
    1991/92- Boavista: 38 jogos/31 golos
    1992/93- Boavista: 35 jogos/15 golos
    1993/94- Boavista: 37 jogos/11 golos
    1994/95- Belenenses: 8 jogos/1 golo


    «No Benfica marquei seis golos e no jogo a seguir voltei ao banco»
    Ricky, já se percebeu, foi feliz no Estádio do Bessa. Marcou 30 golos na época 1991/92, já depois de ter brilhado no Estrela da Amadora. No Benfica é que… nem Eusébio lhe valeu.
    «Bem, o senhor Lucídio Ribeiro [empresário] conheceu-me no Metz, em França, e levou-me para o Benfica. Assinei contrato, fui na digressão da pré-época de 1988 e parti a perna».
    Azar, muito azar, no primeiro jogo de águia ao peito. «Foi em Nova Iorque. Jogámos num sintético e… acabou. Fiquei seis meses de fora, a sofrer. Quando voltei estava cheio de vontade e fiz aquela maravilha contra o Riachense (risos). Seis golos!».
    E depois, no jogo seguinte?
    «Voltei ao banco [15 de janeiro de 1989, 1-0 ao Sp. Espinho, Luz]. E nem sequer entrei. O mister Toni preferia o meu amigo Mats Magnusson, o meu amigo Vata e o meu amigo Lima. A malta gostava de mim, pedia para eu jogar mais. Até o senhor Eusébio pedia».
    Até Eusébio? E Toni, nada?
    «Nem o senhor Eusébio me conseguiu fazer titular do Benfica. Mas ajudou-me muito, deu-me grande moral. Dizia muitas vezes: ‘Ricky, tu metes a cabeça onde nenhum tipo mete o pé’. Gosto muito do Toni, mas se o Eusébio fosse o treinador eu nunca tinha saído do Benfica. Gosto do Benfica». 

    Um hat trick de Ricky contra o Paços (1991/1992):

    Sim, Ricky gosta do Benfica, até hoje. Sempre gostou.
    «No Boavista, o meu clube, marquei um golo ao Benfica. Contra a minha vontade, custou-me muito (risos). Enfim, tenho pena de não ter ficado na Luz mais umas épocas. Tenho saudades de viver na zona do Estoril e de me encontrar cedinho com o Mats [Magnusson] no café. Ficávamos a conversar sobre futebol, sobre a família, a partilhar os segredos sobre o golo».
    Sem espaço nas opções de Toni, Ricky muda-se para a Reboleira. E conhece José Mourinho.

    «O Zé era o maior. Num treino, ele vira-se para mim e diz: ‘Ricky, tu faz o que eu te digo. Vou ser um grande treinador, acredita em mim’. E agora vejo-o a ser o Special One. Até fico comovido. Era só um adjunto do Manuel Fernandes, mas vivia bem, percebia-se que era inteligente. Gostei de estar com ele e depois com o professor Jesualdo». 

    Ricky fala de «Duílio, Bobó e Marlon», mas também de João Alves. «Um homem especial, carismático. Só tive o azar de não jogar a final da Taça de Portugal, contra o Sp. Farense. Parti o braço e tive de torcer por fora».

    Golo de Ricky no Bessa ao Benfica (1991/1992):


    Em Salvador, Ricky gere um negócio do ramo imobiliário - «compro, vendo e arrendo casas» - e mantém «com orgulho» a condição de agente FIFA, «número 147».
    Promete visitar Portugal «em julho», particularmente as cidades de Lisboa e Porto, onde viveu. «Adorei estar em Lisboa, mas depois de conhecer o Norte… sou apaixonado pelas pessoas do Porto. Integrei-me muito rapidamente. E só não volto porque a minha mulher é baiana e não deixa (risos)».
    Por falar em Porto, Ricky retorna aos tempos do Boavista. Do Boavistão, de um Bessa a abarrotar de gente, de equipas fortíssimas a vestir de xadrez.
    «Quero aproveitar para dizer isto: o major Valentim Loureiro, ao contrário do que muitos pensam, é um homem fantástico. Sempre cumpriu o que prometeu, é um homem de palavra. E o Manuel José foi um dos melhores treinadores que conheci, uma raposa, matreiro e esperto».

    Ricky recorda, por exemplo, a histórica eliminatória contra o Inter de Milão. «Ganhámos 2-1 no Bessa. Foi um escândalo. E o major teve um papel determinante (risos)».

    «Antes do jogo, ele desceu ao balneário e disse: ‘meus meninos, hoje trago uma caixa cheia de dinheiro. Se isto correr bem, a caixa vem para aqui. Se não correr… volta comigo para casa’ (risos). O Boavista tinha um espírito único, familiar e exigente».

    «Fui descoberto na Nigéria pelo Otto Glória»
    Perto do fim, o Maisfutebol coloca mais duas questões em cima da mesa. E Ricky, atrás de mais uma ou outra gargalhada, responde sempre no mesmo tom. «Você sabia que…?»
    «Você sabia que foi o Otto Glória a descobrir-me na Nigéria? Ele era o selecionador, viu-me a jogar num clube pequeno e disse logo que eu tinha de ir para o Brasil. Tinha 20 anos e assinei pelo América. Começou tudo assim. O Otto Glória, que coincidência, não?»
    «Você sabia que o zagueiro mais duro que encontrei foi o Fernando Couto? O menino era bom, mas intimidava e ameaçava. Dizia que me batia e tal. Era muito bom. Os mais difíceis que apanhei foram todos do FC Porto: Couto, Celso e Aloísio. Defesas centrais de altíssimo nível».
    Até breve, Ricky!


    in MaisFutebol

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